Por Dr. Petrus Raulino

Um estudo publicado na revista Frontiers in Psychiatry traz mais algumas possíveis peças do grande quebra-cabeça que é fazer pesquisas sobre as bases biológicas da depressão.

O estudo demostrou diferenças entre a composição celular do cérebro em adultos deprimidos que morreram por suicídio em comparação a indivíduos sem histórico psiquiátrico que morreram repentinamente por outros meios.

Análises do estudo

Foram analisadas amostras cerebrais post mortem de indivíduos do sexo masculino que morreram por suicídio na vigência de episódio depressivo grave e amostras cerebrais de indivíduos do sexo masculino que morreram repentinamente sem nenhuma doença inflamatória, psiquiátrica ou neurológica.

Foram analisadas três regiões do cérebro de todos os indivíduos do estudo: córtex pré-frontal dorso-medial, núcleo caudado dorsal e o tálamo médio-dorsal. Nestas regiões foram analisados os astrócitos.

Os astrócitos são células gliais frequentemente em forma de estrela que constituem aproximadamente metade das células do cérebro humano.

Os astrócitos formam a estrutura do cérebro e têm funções importantes como a sustentação e nutrição dos neurônios.

Os astrócitos são células heterogêneas, com diferentes subtipos quanto a morfologia, desenvolvimento, metabolismo e fisiologia.

Foram analisados os astrócitos no cérebro, colorindo proteínas específicas encontradas em sua estrutura (proteína glial fibrilar ácida e vimentina).

Através de um microscópio, o número de astrócitos foi contado em seções transversais.

Foram avaliadas também as densidades vasculares das regiões cerebrais compreendidas pelo estudo, porque em estudo prévio foi encontrada estreita associação inversa entre densidade regional de astrócitos e densidade vascular.

Principais resultados da pesquisa

A pesquisa demonstrou uma redução do número de astrócitos nas áreas cerebrais dos adultos deprimidos.

Já a densidade vascular e as características morfométricas dos astrócitos foram semelhantes entre os grupos, exceto na substância branca pré-frontal, na qual houve vascularização aumentada e os astrócitos exibiram menos processos (prolongamentos) primários.

Apesar da estrutura dos astrócitos em deprimidos estar semelhante aos dos indivíduos sem histórico psiquiátrico, o número de astrócitos estava reduzido na depressão.

 

Baixa densidade de astrócitos em cérebro de deprimidos com suicídio (E) em comparação a indivíduos sem histórico psiquiátrico (D)
FIGURA 1 – Baixa densidade de astrócitos em cérebro de deprimidos com suicídio (E) em comparação a indivíduos sem histórico psiquiátrico (D). Fonte: O’Leary e col. (2021).

Algumas limitações da pesquisa foram importantes para se destacar:

  • amostra pequena;
  • ausência de mulheres na amostra;
  • falta de informações sobre número e gravidade de episódios depressivos prévios;
  • tempo de evolução;
  • duração do episódio atual;
  • tratamentos, etc.

Conclusão

De qualquer maneira o estudo é instigante o suficiente para estimular novas pesquisas.

Será que a depressão pode estar ligada à composição celular do cérebro? Se sim, de forma estática ou dinâmica?

Quem sabe a notícia promissora no futuro esteja relacionada ao conhecimento de que, ao contrário dos neurônios, o cérebro humano adulto produz continuamente novos astrócitos.

 

Referências

O’Leary, L. A., Belliveau, C., Davoli, M. A., Ma, J. C., Tanti, A., Turecki, G., & Mechawar, N. (2021). Widespread decrease of cerebral vimentin-immunoreactive astrocytes in depressed suicides. Frontiers in Psychiatry, 12, 75.

O’Leary, L. A., Davoli, M. A., Belliveau, C., Tanti, A., Ma, J. C., Farmer, W. T., … & Mechawar, N. (2020). Characterization of vimentin-immunoreactive astrocytes in the human brain. Frontiers in Neuroanatomy, 14.